sábado, 13 de junho de 2015

Boca 21: a pulseirinha da moda


O tema do momento é indiscutivelmente a suposta alteração da medida de coação imposta ao ex-PM Eng.º José Sócrates de prisão preventiva para prisão domiciliária com aplicação de pulseira electrónica. Houve muito burburinho mas não chegou a saber-se claramente se, afinal, a alteração foi mesmo proposta ao ex-PM e este recusou ou se, ao invés, perante a manifestação pública da intenção de não aceitar a medida esta não lhe foi sequer apresentada, decidindo o juiz pela manutenção da prisão preventiva. Não nos interessa em particular o caso do ex-PM, como sempre, mas enquanto representativo do elevadíssimo número de casos de prisão preventiva em Portugal, o caso serve de mote à discussão, por outras palavras apresta-se a umas quantas bocas.
Quando alguém é preso preventivamente a primeira coisa que ocorre dizer ao cidadão comum, especialmente quando está em causa um político é o seguinte: “já vai tarde” ou “ainda cá ficam muitos”. Na mente do trabalhador que se levanta ao cantar do galo para ganhar meia dúzia de trocos no final do mês deviam ser todos presos desde o presidente aos ministros, passando pelos secretários de estado, sem esquecer os directores-gerais. Todos, do primeiro ao último, deviam estar atrás das grades.
O povo pensa e a justiça responde. Bem ou mal os juízes têm vindo a fazer aquilo que o povo exige ao mandar os delinquentes primários, secundários e terciários aos magotes para trás das grades no estrito cumprimento da lei. Um cidadão pode estar preso preventivamente durante seis meses, um ano ou dois anos simplesmente porque a lei permite e ponto final. Portanto, se não quiserem que um pobre desgraçado esteja na choça tanto tempo sem saber às quantas anda basta fazerem muita força para que a lei seja alterada. E razões não faltam.
Em primeiro lugar convém ressalvar que não há nenhum ordenamento jurídico que este escriba conheça que não tenha prisão preventiva. Já imaginaram o que seria viver num país em que a lei obrigasse o suspeito a ser julgado imediatamente após o cometimento do ilícito. Seria um país de justiça em cima do joelho com resultados facilmente imagináveis. E se o julgamento não fosse realizado de imediato mas o suspeito não pudesse ficar detido preventivamente como seria? A resposta é fácil de adivinhar. Se fosse culpado e a pena correspondente fosse daquelas de fazer moça a primeira coisa que o suspeito fazia era pôr-se ao fresco de maneira a que a justiça tão depressa não lhe pusesse os olhos em cima. Se ao crime correspondesse uma pena merdosa, ainda assim o suspeito não perderia a oportunidade de baralhar as contas à investigação, destruindo provas, coagindo testemunhas, etc. E quando o crime estivesse entranhado no sangue das pessoas o que é que acontecia? Acontecia que o suspeito ainda não tinha acabado de cometer um crime e já estava a cometer outro e mais outro, ou seja, ainda não tinha sido julgado do primeiro crime e já tinha cometido mais umas dúzias deles. E quando o povo se fartasse e fizesse justiça pelas próprias mãos, linchando o suspeito na praça pública? Concluiu-se, portanto, que até para defesa do próprio suspeito é bom que exista a prisão preventiva.
A questão que se põe é outra. Como é possível prender-se alguém preventivamente e depois não conseguir produzir uma acusação no espaço de seis, sete, oito meses. Então os pressupostos que servem para manter alguém preso preventivamente não são suficientemente fortes e consistentes para obter uma condenação dessa pessoa em julgamento? Reside aqui uma contradição incompreensível: pode dizer-se que os pressupostos da prisão preventiva estão essencialmente direccionados para a boa prossecução do inquérito, mas não pode olvidar-se que todo o tempo que é passado em prisão preventiva é descontado no tempo de prisão que efectivamente venha a ser aplicada ao arguido, o que significa que esta prisão dói tanto como a outra. É precisamente a mesma coisa: os piolhos e os percevejos que existem na cela do preso preventivo não são diferentes do que existem na cela do preso condenado. Portanto, quando se prende alguém preventivamente, a investigação já tem de estar suficientemente consolidada e avançada a ponto de permitir o julgamento num curto espaço de tempo. É necessário fazer perícias de última hora – façam-se; é necessário esperar por documentação relevante – espere-se; é necessário preparar toda a logística do julgamento – prepare-se. Mas não se mantenha ninguém atrás das grades porque a polícia e o MP não são competentes o suficiente para investigar os suspeitos no seu habitat natural.
Dá a impressão que a lei não permite escutas telefónicas, que a lei não permite fazer localização celular, que a lei não permite fazer apreensões de correspondência, que a lei não permite fazer filmagens, que a lei não permite tirar fotos, que a lei não permite fazer vigilâncias, que a lei não permite fazer seguimentos, que a lei não permite fazer buscas, que a lei não permite fazer revistas, que a lei não permite fazer exames, que a lei não permite fazer perícias, que a lei não permite interrogar testemunhas, que a lei não permite fazer acareações. A lei permitiu e permite tudo isto e mais qualquer coisa. Inclusive a lei, entenda-se outras leis, permitiram construir melhores instalações para as polícias (o corpo superior de policia criminal não pode queixar-se dos milhões que foram gastos na sua luxuosa sede), permitiram comprar mais e melhores viaturas, permitiram adquirir material e equipamento mais moderno e permitiram, dentro do possível, remunerar melhor o pessoal.
Então o que é que falta para que a investigação criminal funcione e não necessite de prender para investigar? Falta uma coisa simples. Falta cortar o mal pela raiz, encolhendo o prazo de duração da prisão preventiva para um período aceitável. Um mês é pouco, dois meses talvez não chegue, mas em três meses faz-se muita coisa se houver profissionalismo. E, em bom rigor, salvo casos pontuais, que diferença faz à investigação o facto de o arguido estar em prisão preventiva ou com obrigação de permanência na habitação (é assim que a vulgar prisão domiciliária se denomina)? Não faz diferença nenhuma a não ser que se tenha especial prazer em ver alguém preso a aguardar julgamento. Tenho para mim que, salvo casos contados, a maior parte dos presos preventivos podiam estar perfeitamente na sua residência sem que daí adviesse mal nenhum ao mundo.
Que perturbação da investigação o arguido pode fazer se está confinado a casa? As comunicações podem estar sob escuta, os contactos com certas pessoas podem ser proibidos e quanto ao resto por favor: se um homem confinado à sua habitação põe a investigação em perigo das duas uma, ou o homem é um mestre do crime ou a polícia e MP são incompetentes.
Quanto ao perigo de fuga dá que rir. Então um indivíduo corta a pulseira electrónica e vai para onde? Na Europa mal se descuida está recambiado através de mandado de detenção europeu. Para fora da Europa que eu saiba tem de ir de avião, a não ser que seja bom nadador. Mas para ir de avião tem de passar pelos aeroportos. Ora, não passa pela cabeça de ninguém que um arguido em obrigação de permanência na habitação não conste no sistema informático dos aeroportos como estando proibido de sair do país.
E quanto ao alarme social nem se fala. Se um indivíduo está na cadeia a sociedade mantém-se calma e serena. Se o mesmo indivíduo estiver em casa sem possibilidades de sair para ir ao barbeiro, à padaria ou à tasca a sociedade mantêm-se tão calma e serena como estava dantes.
A diferença, esta é que é a grande diferença, é que um desgraçado que esteja atrás das grades preventivamente sem necessidade imperiosa de lá estar, está a ser vilipendiado num direito que devia ser preservado até ao último momento: o direito de se defender. Quer se queira quer não, alguém que está preso sem que isso seja de todo necessário, está pura e simplesmente a ser tolhido na sua capacidade de defesa. O que pode fazer um individuo, ainda que seja culpado, no interior de uma cadeia, sem acesso a meios de comunicação, com visitas controladas, etc., para contrariar a máquina do Estado empenhada em juntar as provas para obter a sua condenação. Aliás, sob o ponto de vista dos princípios a máquina do Estado corporizada pelo MP assistido dos órgãos de polícias Criminal não devia tão e somente preocupar-se em obter a verdade. Devia empenhar-se na obtenção da verdade material que implica muitas vezes trazer ao processo provas que contrariam a tese da própria acusação, assim elas se deparem no percurso da investigação.
Infelizmente estamos num mundo imperfeito em que os princípios valem o que valem, ou seja, valem nada. A partir do momento em que o investigador se convence da culpabilidade de alguém, como é óbvio, direcciona a investigação no sentido de comprovar a sua tese, excluindo tudo o que possa abonar em favor do arguido e não tenhamos dúvidas que durante a investigação nem tudo o que é apurado é desfavorável ao arguido. Mas para isso existe o arguido, atrás das grades, como é evidente, e o seu advogado, se tiver dinheiro para lhe pagar. Esta é a verdade material que temos.

Bocaslusas

sexta-feira, 5 de junho de 2015


BOCA N.º: 20: AI JESUS TANTO MILHÃO

A notícia da semana, para não dizer a notícia do mês, senão a notícia do ano, até ao momento, foi sem duvida a transferência do JJ para o Sporting. Que outra notícia levaria a minha cara metade a ter a coragem de me acordar à uma hora da madrugada para me dizer que o JJ se tinha passado para o lado da lagartagem. Quando os meus filhos nasceram  a meio da noite só me deram a notícia de manhã, quando morreu o Papa só me deram a notícia no dia seguinte e vem agora perturbar-me o sono para me dizer que o JJ vai ganhar mundos e fundos para o Sporting. Vai mas é dar uma volta que eu nessa não caio. Então o Sporting não pode com uma gata pelo rabo e vai pagar... Quanto? E pá deixa-me dormir senão atiro-te com um chinelo.
E com isto virei o corpinho para o lado tentando retomar o sono interrompido assim de forma abrupta. Entretanto, enquanto a pestana não fechava novamente fui pensando: ela está a brincar com a coisa, mas gostava de ver o pagode se o JJ desertasse.
No dia seguinte caí na real. Era verdade, o homem abandonou mesmo os vermelhuscos. Que grande porra, eu que até nem apreciava especialmente o personagem vou ter de levar com ele no meu clube. Agora vou mandar bocas acerca de quem. Aquelas conferências de imprensa a seguir aos jogos eram de partir o caco. Só visto. A cena do "somos imundes a pressões" foi de morte. E agora?
Agora olha. Tenho de calar o trombil,  levar com ele e esperar que comece a ganhar tudo e mais alguma coisa porque o graveto que nos vai esmifrar dava para comprar fruta como o caraças e se calhar ganhávamos bem mais com bem menos. Já viram? Seis milhões por ano. As contas são fáceis de fazer. Férias e começa não começa a treinar vão dois meses de costas ao alto, logo sobram dez de «trabalho». Limpinho: seis milhões a dividir por dez dá seiscentos mil por mês; a dividir por trinta dias dá vinte mil euros por dia; ou seja, dez mil euros em cada meio-dia. O homem levanta-se já o sol vai alto e já encaixou dez mil dele enquanto estava a xonar. Portanto, dez mil em doze horas, cinco mil em seis horas, dois mil e quinhentos em três horas. Porcaria. E agora não dá conta certa a divisão de dois mil e quinhentos por três. E pá, paguem lá seis milhões e mais uns pózinhos ao mister para esta treta dar certo. Tem alguma piada o homem ficar a ganhar oitocentos e qualquer coisa euros à hora. No mínimo davam-lhe novecentos à hora o que a dividir por sessenta minutos dava conta certa: quinze eurinhos por minuto. Já agora vamos ao pormenor sem ir buscar a calculadora. Quinze euritos por minuto dá tanto como uma notita de cinco em cada vinte segundos o que dá uma moedinha de euro em cada quatro segundos, tudo se resumindo a uma bagatela de vinte e cinco cêntimos por segundo. Estou a ver. O contrato foi feito assim: meus amigos por cada batida do meu coração bota para cá vinte cêntimos e mais umas pastilhas gorila pagas com as sobras para eu mascar no banco e nas conferências de imprensa.
Vai dar raia, vocês vão ver. Quando a coisa começar a dar para o torto e aquele coração entrar em taquicardia o Bruno vai ter de acampar à porta da casa da moeda. Para pagar ao homem vai ter de instalar umas maquinetas como aquelas que há nos casinos e a cada horita cada uma delas vai ter de ter parir uma enxurrada de moedas de vinte cêntimos para dar ao JJ. Quero ver se vai manter aquele vozeirão quando começar a inchar a sério e ouvir os carolas aos berros: " ó Bruno de Carvalho vai para o tal sítio" ou "ó Jesus vai para o mesmo sítio do Bruno".
Para já vamos aguardar para ver. Vamos dar o benefício da dúvida ao JJ porque ele afinal era lagarto desde pequenino e nós não sabíamos. Agora vamos ver se ele é um lagarto a sério, daqueles que nós na beira baixa chamamos de sardão e abrem a boca assim como os crocodilos para amedrontar os inimigos ou vamos ver se ele é assim do tipo osga ou salamandra. Estas parecem lagartos mas não são. Aliás as salamandras são venenosas e os outros répteis até as evitam.
Nem gosto dessa cena da lagartagem. Prefiro o leão.  Estou convencido que ele tem coração de leão, determinação de leão e juba de leão. Esta saiu sem crer... Peço desculpa. Mas estou ansioso por ver o maior felino à superfície do planeta rugir e lançar as garras as esses lampiões, digo a essas catatuas que vai não vai voam e já não voltam. Estou desejoso de ver o rei da selva malhar forte e feio nos dragões que este ano devem estar assadinhos por dentro porque não se lhes viu vomitar chamas como é costume.
Mas desejava muito mais que tudo se tivesse passado com elevação. Agora a sério. O JJ tem o direito de ir para onde bem entender, incluindo o Sporting. E o Sporting também tem o direito de rescindir o contrato com o MS ainda que este tenha feito um óptimo trabalho e seja um excelente treinador, mas atenção. Rescindir significa pagar aquilo a que ele tem direito sem andarem com subterfúgios para não lhe pagar. Nós Sportinguistas, gente de bem, sabemos bem o que está a ser feito e se não é parece. E o que parece é e não me convencem do contrário: o treinador que acabou de ganhar uma taça de Portugal e fez terceiro lugar com um orçamento da chacha levou um pontapé no traseiro e foi posto no olho da rua à má fila. Agora alega-se justa causa por não vestir a fatiota oficial uma vez. Por não ter isto. Por não ter aquilo. Estou triste.
Estou a ver o filme. O pensamento é o seguinte: se queres receber aquilo a que achas que tens direito recorre ao tribunal e talvez daqui a uns anos te resolvam o assunto, mas como entretanto te vais fartar vais baixar a bolinha se quiseres receber uns trocos bem abaixo daquilo a que tens direito. Coisa linda.
Ó Marco, aceita o conselho de um sportinguista que manda umas bocas foleiras mas tem vergonha na cara e não se revê neste tipo de actuação. Deixa os tribunais resolverem o assunto e a verdade há-de vir ao de cima. Nessa altura provavelmente estarás a singrar na vida porque tens valor para isso e se for no Benfica que seja. Como diz o povo "o último a rir ri melhor" e no teu caso não te rias somente. Dá umas valentes gargalhadas.
E pronto, ganha os jogos todos menos aqueles em que defrontares o Sporting.

Bocaslusas.